Violência Doméstica e Medida Protetiva: Entenda seus direitos, garantias legais e os caminhos para romper o ciclo da violência

Santos & Urel advogados | 09 de junho de 2025 às 07:00

A violência doméstica ainda é uma realidade alarmante no Brasil. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, uma mulher é vítima de violência física a cada 4 minutos no país. Diante disso, o ordenamento jurídico brasileiro dispõe de um dos mecanismos mais avançados de proteção à mulher: a Lei nº 11.340/2006, mais conhecida como Lei Maria da Penha.

Neste artigo, abordamos os tipos de violência previstos na legislação, explicamos como funcionam as medidas protetivas de urgência, o trâmite judicial, os direitos das vítimas e o papel da advocacia nesse processo.


O que é considerado violência doméstica segundo a lei?

A Lei Maria da Penha conceitua a violência doméstica e familiar contra a mulher como qualquer ação ou omissão baseada no gênero que cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial (Art. 5º da Lei 11.340/06).

Formas de violência (Art. 7º da Lei Maria da Penha):

  1. Violência física: qualquer conduta que ofenda a integridade ou saúde corporal.
    • Exemplo: socos, empurrões, uso de objetos como cintos, panelas ou armas.
  2. Violência psicológica: condutas que causem dano emocional, diminuição da autoestima, controle de ações e comportamentos.
    • Exemplo: ameaças, manipulação emocional, isolamento da vítima.
  3. Violência sexual: qualquer conduta que constranja a mulher a manter ou presenciar ato sexual não desejado.
    • Exemplo: estupro dentro do casamento, gravidez forçada, exposição à pornografia.
  4. Violência patrimonial: retenção, subtração ou destruição de bens, valores ou documentos.
    • Exemplo: impedir acesso a cartões bancários, rasgar roupas, destruir celular.
  5. Violência moral: caluniar, difamar ou injuriar a mulher.
    • Exemplo: acusar falsamente de traição, espalhar boatos ofensivos.

O que são medidas protetivas de urgência?

Previstas nos artigos 18 a 24 da Lei Maria da Penha, as medidas protetivas de urgência são ferramentas legais que o juiz pode aplicar, de forma rápida, para preservar a integridade física e emocional da vítima.

Exemplos de medidas (Art. 22, Lei 11.340/06):

  • Afastamento imediato do agressor do lar.
  • Proibição de contato com a vítima (por qualquer meio).
  • Proibição de frequentar certos locais.
  • Restrição ou suspensão da posse de arma.
  • Prestação de alimentos provisionais ou provisórios.

Além disso, o juiz pode aplicar medidas protetivas em favor dos dependentes da vítima, como filhos e pessoas sob sua responsabilidade.

📌 Prazo de análise: o juiz deve decidir sobre a concessão da medida em até 48 horas após o recebimento do pedido (Art. 18, §1º).


Como funciona o processo: do pedido à decisão

Etapas principais:

  1. Boletim de Ocorrência (BO)
    • A vítima deve procurar a delegacia (preferencialmente da mulher), relatar os fatos e solicitar a medida protetiva.
  2. Pedido judicial da medida protetiva
    • Pode ser feito:
      • Pela delegacia à autoridade judiciária (Art. 12, III).
      • Pela Defensoria Pública.
      • Diretamente pela vítima, com apoio de advogado.
  3. Manifestação do Ministério Público
    • O promotor analisa o caso e se manifesta em até 48h.
  4. Decisão judicial
    • O juiz poderá conceder a medida mesmo sem ouvir o agressor inicialmente (Art. 19, Lei 11.340/06).
  5. Citação do agressor e intimação da vítima.

E se o agressor descumprir a medida?

O descumprimento de medida protetiva é crime autônomo previsto no Art. 24-A da Lei Maria da Penha:

“Descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência previstas nesta Lei: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos.”

Mesmo que não haja nova agressão, o simples ato de se aproximar ou mandar mensagens já pode configurar o crime de desobediência à ordem judicial, com possibilidade de prisão preventiva.


A violência doméstica e seus reflexos no Direito de Família

Nos casos em que há filhos menores, a violência doméstica pode influenciar:

  • A guarda dos filhos: O agressor pode perder ou ter suspenso o direito à guarda (Art. 22, §1º, Lei 11.340/06).
  • Pensão alimentícia: O juiz pode determinar alimentos provisórios em favor da vítima e dos filhos.
  • Visitas monitoradas: Se o agressor for pai, a convivência pode ser suspensa ou realizada de forma assistida.
  • Perda do poder familiar (Art. 1.638 do Código Civil), em casos mais graves.

O papel da advocacia nesses casos

O advogado é o profissional que irá:

✅ Orientar a vítima sobre seus direitos legais;
✅ Redigir e protocolar pedidos de medidas protetivas;
✅ Acompanhar o inquérito e a ação penal contra o agressor;
✅ Representar a vítima em ações de guarda, alimentos, divórcio e partilha;
✅ Atuar como agente de acolhimento, respeito e proteção.

Além disso, é essencial que a atuação seja humanizada, com escuta ativa e empatia, para garantir segurança e conforto à vítima.


Jurisprudência relevante

“Concede-se medida protetiva de urgência com base na palavra da vítima, quando coerente e respaldada pelo histórico de violência doméstica, conforme entendimento do STJ.”
(STJ – HC 598.051/SP, julgado em 2020)

“O descumprimento de medida protetiva configura crime autônomo, mesmo sem reincidência de violência.”
(STF – HC 144.826/DF, Rel. Min. Rosa Weber)


Políticas públicas e rede de apoio

O Brasil conta com estruturas de atendimento específicas:

  • Disque 180 – Central de Atendimento à Mulher.
  • Casa da Mulher Brasileira – oferece apoio jurídico, psicológico e assistencial.
  • Delegacias Especializadas (DEAMs).
  • Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.

Considerações finais

A violência doméstica é uma violação de direitos humanos e precisa ser tratada como questão de segurança pública, saúde e cidadania. A Lei Maria da Penha representa um marco civilizatório, mas sua eficácia depende do conhecimento e do uso consciente das ferramentas legais disponíveis.

A medida protetiva de urgência é o primeiro passo para romper o ciclo da violência, proteger a vítima e iniciar um processo de reconstrução da dignidade.

Se você é vítima ou conhece alguém que precisa de ajuda, denuncie. Busque orientação jurídica. A lei está ao seu lado.

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